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terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Blues, Ausone e uma Zakharov





    A delegada Fernanda Vaz Coelho, acompanhada apenas do inspetor Arnaldo Young é surpreendida pelo assassino. Ele, Julius, friamente fecha a porta, senta-se à cadeira e pergunta:
    - O que fazem aqui?
    A delegada responde:
    - Viemos em busca de você mesmo, Julius Deodor Rodrigues. Você está preso por torturar, canibalizar e assassinar pessoas, além da extensa ficha que você tem de vários outros crimes.
    Julius, ironizando reage:
    - Como assim? Assassino? Eu? Apenas dou àquelas pessoas o que elas merecem.
    O inspetor Arnaldo pergunta:
    - Pois bem, então o que o seu antigo motorista de ônibus fez para merecer aquela morte cruel?
    Julius leva a mão ao queixo como se quisesse lembrar... até que diz:
    - Ah! Vocês estão se referindo ao Huston Chagas? Motorista do extinto Colégio Órion? Putz! Aquele velho merecia morrer porque era muito escroto. Vivia de cara fechada e sempre dava partida quando eu estava chegando perto da porta do ônibus. Talvez agisse assim por causa da minha condição de bolsista, já que ele tratava super diferente de mim os irmãos Kricks... Que por sinal também mereceram o final que tiveram...
    A delegada Fernanda pergunta:
    - Você poderia nos contar como foi que você matou o Huston?
    Julius se levanta da cadeira e responde:
    - Não. Não vou contar, até porque vocês têm em suas mãos o meu relato. Procurem!
    Julius vai até a cozinha e prepara um café. Ele oferece a Fernanda, que recusa, mas o inspetor Arnaldo aceita. Fernanda diz: “não aceita. Vai que tem algo nisso?” O inspetor não dá ouvidos a delegada. Julius põe o café na mesa e diz ao inspetor para se servir. É aí que a delegada Fernanda começa a ler o diário:
    “14 de abril de 1994. Era uma manhã de quinta-feira, quando saí do chalé e fui direto para o Colégio Órion. No meio do caminho eu peguei uma carona com o velho Huston. Fiz-me passar por um aluno do ensino médio e ele me deixou entrar, nem me reconheceu. Chegando ao colégio, tratei de me aproximar ainda mais daquele velho oferecendo-lhe um café, um lanche...”
    Fernanda interrompe sua leitura que fazia mentalmente por causa de Julius que oferece salgadinhos a ela e ao inspetor, que novamente aceitara. Menos a delegada. E em instantes volta a ler:
    Vejamos... Ah! “... Então, após lhe oferecer um lanche, o chamei para ir comigo a um lugar, mas ele não aceitou. Então, aguardei até que ele entrasse em seu ‘camarim’ e dei início ao segundo ato da MINHA peça. Bati na porta, de educado que sou, e entrei. Eu sabia do que na realidade aquele velho gostava. Eu sabia que por trás daquela casca de durão tinha um leãozinho prestes a ser domado. Então, dei o que ele queria e precisava. Foram minutos... até que acabássemos. Eu pus minha calça e via em seus olhos que pedia mais. Então, o convidei para ir à minha casa. Estava na cara que depois do que tivera passado ele aceitaria. E ele aceitou. Na noite do mesmo dia, ele chegou. Apesar das rugas, aquele velho não apresentava muito os seus sessenta e poucos anos, tinha cara de trinta. Então, naquela noite bebemos uma garrafa de Ausone* e dançamos ao som do Blues de Aretha Franklin... Ele nunca pôde ter experimentado um vinho tão caro em toda sua vida. Mas valeu por tudo. Foi a melhor noite que ele já teve. De madrugada, me levantei da cama, fui até a cozinha onde peguei minha Zakharov** e voltei para o quarto. Ele morreu dormindo, tem morte melhor que essa? Ha ha, não! Desferi vários golpes na cabeça, no peito e no pescoço. Pelo que me lembro, passaram de trinta golpes. Logo depois eu o amarrei de cabeça para baixo e fiz um corte na garganta dele, pus uma taça e deu para enchê-la com sangue para escrever essa anotação. E foi assim que aquele velho morreu.”

* Chateau Ausone: marca de vinho produzido na França.
** Zakharov: tipo de faca.

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